domingo, 20 de dezembro de 2020

AS REFERÊNCIAS ESTÃO A DESAPARECER…

 

Por: Catarina Bexiga

A pandemia mudou todas as expectativas e todos os planos que tínhamos para 2020… A temporada resumiu-se a cerca de 40 festejos; e todos os intervenientes directos (e não só!) viram a sua actividade suspensa… sem conhecer o dia de amanhã e sem vislumbrar o futuro… Um ano verdadeiramente cinzento!

Como se não bastasse… 2020 fica marcado pelo falecimento de várias personalidades taurinas, nomes sobejamente conhecidos, que deixam obra... Entre outros, recordo, por exemplo, os matadores de toiros Mário Coelho e Armando Soares; e hoje soube também do desaparecimento do cavaleiro e ganadero José Luís Sommer d’Andrade.

Estes foram testemunhos vivos que tivemos o gosto (e a sorte!) de conhecer ou de ouvir falar; que nos ajudaram a entender outros tempos – muito mais românticos e muito mais puros – que falavam com paixão sobre as suas paixões; que dominavam a história do toureio; que sabiam transmitir os seus pensamentos e defender as suas ideias; que alimentaram tertúlias por horas e horas sem que alguém se cansasse de os ouvir falar…

Como aficionada, sinto que estão a desaparecer as REFERÊNCIAS. Estamos a ficar cada vez mais pobres; cada vez com menos memórias; cada vez com menos pessoas que nos inspirem e que nos motivem; que, inclusive, defendam os valores que ergueram alto o toureio. Quem não teve a possibilidade de os conhecer, aconselho que leiam as entrevistas que os três concederam à revista Novo Burladero:

Mário Coelho, N.º 260, Julho de 2010
J. L. Sommer d’Andrade, N.º 310, Novembro de 2014
Armando Soares, N.º 340, Julho de 2017

Infelizmente, estamos a ficar sem símbolos, sem REFERÊNCIAS… a ponto de ficar à deriva!

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

VILA FRANCA: NÃO ERA PARA “MENINOS”…

Por: Catarina Bexiga

Noite exigente, ontem, na Palha Blanco. Uma noite que não era para “meninos”… Uma daquelas que faz passar medo, que obriga a um esforço suplementar, que faz suar… mas que traz – quando há superação – um contentamento acrescido. E ontem, os aficionados vilafranquenses mostraram que exigem, mas também reconhecem!

Dos seis Palhas que saíram à arena, o segundo foi assobiado por ser impróprio para a Palha Blanco, sem cara e sem trapio; os restantes saíram dentro do tipo da ganadaria. De comportamento, excepto o segundo e o terceiro, que não dificultaram; os outro quatro saíram mansos e duros.

A Luís Rouxinol tocou o pior lote. Dois Palhas que pediram ofício e maturidade toureira. Dois Palhas que não consentiram actuações estudadas, nem “engenharias” modernas. Dois Palhas dos que os toureiros não gostam, mas dos que revelam, na verdade, quem é TOUREIRO. E Rouxinol andou em TOUREIRO. Destaco a forma como recebeu o seu primeiro, com o “Icaro”; e como terminou a actuação do seu segundo, no “Douro”, com dois sesgos brilhantes.

Francisco Palha voltou a marcar a diferença de saída, com duas gaiolas, montado no “Jaquetón”.  O seu primeiro (o tal impróprio para a Palha Blanco) deixou-se, e com o “Gingão” teve dois ferros mais impactantes, o terceiro e quinto. O seu segundo foi um Palha complicado que acabou em tábuas. Com o “Roncalito”, a lide foi árdua, laboriosa, mas muito meritória.

António Prates assinou na Palha Blanco uma das actuação da sua vida. Resta-lhe tirar ilações… Ficou provado que a sinceridade e simplicidade no toureio são virtudes irrefutáveis. Montado no “Melocotón”, cravou quatro curtos que fizeram explodir de entusiasmo os aficionados vilafranquenses, em sortes frontais, provocadoras, e com reuniões cingidas. Com o que encerrou a noite praticou um toureio menos consistente e menos convincente.

Noite exigente, mas de superação teve o grupo de Vila Franca. Pegaram Nelson Moreira à primeira tentativa, superiormente ajudado pelo grupo – que assim andou toda a noite – Pedro Silva à primeira, Guilherme Dotti com um par de braços “capaz de mover montanhas” também à primeira, João Luz foi dobrado por João Matos, Rui Godinho (um grande forcado que se despediu) pegou à terceira e o cabo Vasco Pereira também à terceira. Noite exigente para todos. Noite que não era para “meninos”…

Foto: João Silva / Facebook Tauroleve

segunda-feira, 5 de outubro de 2020

POR MAIS VILA FRANCA’S

Por: Catarina Bexiga

Uma tarde de toiros pode ter muitas matizes; mas sem exigência, sem seriedade, sem emoção… perde a sua grandeza. E hoje é comum ver-se exactamente o contrário. Sempre existiram “pueblos”, mas também sempre existiram as “capitais”, onde a exigência e a seriedade, põem os toureiros no cimo do escalafón. No nosso país, Vila Franca é a única terra onde a exigência e a seriedade ainda se faz sentir. É a única terra onde existe um grupo de aficionados que impõe respeito. É a única terra onde se separa o triunfo do fracasso. Nos tempos que correm, há cada vez menos “verguenza” e cada vez mais “atrevimento”, por isso escrevo “Por mais Vila Franca’s”…

A questão da intervenção permanente dos bandarilheiros durante as actuações (chegam a prejudicar os próprios toureiros) não é novidade para ninguém. Todos sabemos quem são os que abusam. Mas na maior parte das vezes, ninguém diz nada, ninguém assobia, ninguém aponta o dedo… até que os toureiros chegam a Vila Franca!

A tarde de hoje na Palha Blanco resume-se facilmente. Do curro de Prieto de La Cal ( 5 jaboneros 1 berrendo), apenas se destacou o segundo da ordem, um toiro sério, que teve mobilidade, que se arrancou para o cavalo, que nos deixou pendentes do que se passava na arena. Os restantes vieram a menos. O primeiro totalmente desinteressado, o terceiro manseou claramente, o quarto e o sexto foram reservados e o quinto deixou-se…

Manuel Telles Bastos continua longe do “Telles Bastos” que nos entusiasmou. Foi evidente nos dois toiros do seu lote. Marcos Tenório (cuja quadrilha ficou a conhecer Vila Franca) teve um bom começo de actuação com o “Danone”, cravou dois bons curtos, mas depois veio a menos e não esteve à altura do toiro. O próprio reconheceu e não foi ao centro da arena. Com o quinto também não redondeou. Luís Rouxinol Jr. andou discreto com o seu primeiro, mas colocou decisão (a grande virtude da sua actuação), montado no “Amoroso”, para contrariar a inércia do último.

Por parte dos homens da jaqueta de ramagens, o desafio dos “prietodelacal” foi superado com relativa facilidade. Todas as pegas foram consumadas à primeira tentativa. Pelo grupo do Ribatejo: Pedro Espinheira e Rafael Costa. Pelos Amadores da Chamusca: Miguel Santos e Bernardo Borges. Pelos Amadores de Beja: Manuel Vicente e Francisco Patanita.

Amanhã, à noite, a Palha Blanco volta a abrir as suas portas, para uma das datas mais carismáticas do calendário, a nocturna de Terça-Feira!

Foto: Facebook Tauroleve

sexta-feira, 11 de setembro de 2020

LISBOA: A DIMENSÃO DE TRÊS GRANDES TOUREIROS!

Por: Catarina Bexiga

Cartel para aficionados, ontem, em Lisboa (curiosamente, ou talvez não, o que levou menos público à capital). O certo é que os três nomes anunciados fizeram jus à dimensão do seu toureio. E para isso Não precisámos de ver tudo numa só actuação. Dentro de um conceito sério, cada um mostrou as suas capacidades e apresentou os seus argumentos

António Ribeiro Telles assinou duas actuações completamente distintas. No primeiro praticou um toureiro menos puro e com resultados menos convincentes; mas no segundo defendeu o seu estatuto. O de Vinhas (sem trapio para uma praça de toiros de primeira categoria, porque peso é uma coisa e trapio é outra) foi gazapón e não teve entrega (não entendi a chamada do maioral!!!), mas António lidou-o superiormente, mantendo-se ligado e incentivando-o a investir. Montado no Alcochete, do segundo ao sexto curto, a exibição tomou contornos de toureio gourmet.

Em Francisco Palha é evidente o seu cuajo. Andou poderosíssimo com o toiro à garupa, prescindiu quase sempre dos bandarilheiros (o que abona a seu favor), e foi ele, a sua vontade e os seus recursos, que imperaram. Em ambos do lote andou por cima dos adversários. Mais colaborador o primeiro e sem raça o segundo. No seu primeiro, montado no Roncalito, o terceiro e quarto curto foram dois grandes ferros. O segredo foi o mesmo: cite mais curto e abordagem mais verdadeira. No seu segundo, viu-se superior com o Jaquetón de saída e veio a mais com o Gingão nos curtos.

Pelo Aposento do Barrete Verde de Alcochete pegaram Bruno Amaro que dobrou o seu irmão Diogo Amaro (felizmente sem lesões a registar) e João Armando à primeira tentativa. Pelos Amadores de Alter do Chão concretizaram Felipe Ribeiro à quarta e João Moreno dobrou João Galhofas após três tentativas frustradas.

O matador de toiros António João Ferreira voltou a impressionar pela sua firmeza e quietude. Os seus dois toiros não o ajudaram, mas António João mostrou-se indiferente à sorte. O seu primeiro investia humilhado no primeiro muletazo, mas depois custava-lhe a repetir. O seu segundo teve inicialmente mais raça, mas durou pouco. António João aproveitou-lhe o seu melhor pitón, o direito. Faenas de mérito.

João Ferreira cravou dois grandes pares de bandarilhas e saudou nos tércios.

Ao Campo Pequeno voltamos a 1 de Outubro!

Foto: Pedro Batalha

 

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

A VITÓRIA DO COLETE ENCARNADO E A SUA MENSAGEM….

Por: Catarina Bexiga

A edição de 2020 das “7 Maravilhas” coincidiu com um ano atípico – que inclusive barrou a realização da maioria das festividades de norte a sul de Portugal – e foi anunciada como as “7 Maravilhas da Cultura Popular”. Este projecto (que nasceu em 2007) divulga e promove os valores de uma identidade nacional sólida e forte. Ano após anos, temos vindo a conhecer e a entender (ainda melhor) o nosso país e o nosso povo… o nosso património material e emocional, recuperando assim o interesse e o entusiasmo das populações e de quem as visita.

Entre os candidatos da edição de 2020 (cerca de 500), encontravam-se as Festas do Colete Encarnado, que anualmente se realizam, no primeiro fim-de-semana de Julho, em Vila Franca de Xira. Para o aficionado dispensam apresentação!

O Colete Encarnado são as Festas de homenagem ao Campino e a tudo o que ele envolve. Uma herança deixada por José Van-Zeller Pereira Palha e mantida pelos Vilafranquenses. Um legado conservado de geração em geração, que abarca a forma de ser e de estar de um povo. Que reúne práticas e costumes em que nos relacionamos. Que, inclusive, tem uma componente afectiva muito própria. São afinal as Festas em que nós (Aficionados) nos revemos!

Numa época em que existe um movimento organizado contra a Festa de Toiros, este título ganho, ontem, pelo Colete Encarnado (e votado pelo povo!!!) é uma vitória de Vila Franca… e não só!

A Festa de Toiros faz parte do património e da identidade cultural de Portugal. A Festa de Toiros está no sangue do povo português. É uma paixão –  que resistindo ao longo dos tempos a quantas derivações lhe têm proporcionado – continua viva, sincera, receptiva, palpitante… e sempre pronta a explodir de entusiasmo!

Parabéns Colete Encarnado! Parabéns Vila Franca!

Foto: Pedro Batalha

sexta-feira, 4 de setembro de 2020

LISBOA: DUARTE PINTO, O PROTAGONISTA DA NOITE!

Por: Catarina Bexiga

De toureio a cavalo, do que por aí se vai vendo (e do que por aí se vai desejando impor, como a “nova verdade”…), cada vez é mais preocupante o caminho que leva… Para que sobreviva com esplendor e riqueza os seus interpretes terão de revelar outra atitude, sobretudo, os mais novos…. porque é deles o futuro! E foi isso que teve Duarte Pinto! Atitude. Boas intenções. Bom conceito. E disposição. Embora também existam coisa para melhorar…De saída, andou discreto; mas depois para os curtos sacou o “Hábito” e chamou a si a atenção. Ao seu Veiga Teixeira faltou entrega (até foi trotón) e Pinto citou-o (inteligentemente) a favor da querença natural. Mostrou-se nos cites, abordou com rectidão, foi à cara do toiro … e finalmente viu-se “alguém” marcar a diferença! Levou um toque na preparação do quatro, por excesso de confiança, mas que não roubou mérito à actuação. A serie de curto foi em crescendo e Duarte Pinto foi, indiscutivelmente, o protagonista da noite!

O curro de Veiga Teixeira ficou aquém das expectativas. No entanto, o primeiro da ordem foi um toiro que reuniu várias virtudes. Investiu humilhado e com classe nos capotes e depois teve durabilidade e suavidade. Até me deu a sensação que queria mais e não podia… Apenas fez o senão de raspar no fim. Rui Salvador reconheceu a qualidade do seu toiro e lançou o tricórdio para o ganadero que estava sentado nas bancadas. Os restantes careceram de transmissão, uns procuraram as tábuas, outros não se empregaram, outros ainda rasparam… acima de tudo, faltou-lhe personalidade!

Abriu a noite Rui Salvador, que acabou melhor do que começou, especialmente, com a ajuda do “Hornazo”; de Gilberto Filipe foram melhores as intenções do que os resultados; Manuel Telles Bastos apontou duas convincentes tiras montado no “Império”, mas depois não terminou de romper; Ana Rita cravou os ferros à tira e procurou chegar ao público; e Parreirita Cigano andou em plano irregular (mas teve valor o tempo que aguentou na cara do toiro nos dois últimos curtos).

A noite foi de expectativa para ver dois dos melhores grupos do país. Pelos Amadores de Montemor-o-Novo pegaram Vasco Ponce à primeira, Francisco Barreto também à primeira e Francisco Borges à quarta. Pelos Amadores de Alcochete concretizaram Vitor Marques à segunda, Manuel Pinto também à segunda e João Belmonte à primeira. Levaram “melhor sabor de boca” os alcochetanos…

Foto: Ovação e Palmas

sexta-feira, 28 de agosto de 2020

LISBOA: TESTEMUNHO E REFLEXÃO!

Por: Catarina Bexiga

Hoje vou abordar a última Quinta-feira no Campo Pequeno de forma diferente O Toureio a Cavalo está numa fase de importante (mas também inquieta) transição. Ora vejamos, cavaleiros com mais de vinte e cinco anos de Alternativa (ex. de Moura, Telles, Salvador, Rouxinol, etc.) já têm as suas carreiras confirmadas e a os seus méritos assegurados. Daí que, sejam os nomes que fazem parte das gerações seguintes, os actores dos próximos episódios da História do Toureio a Cavalo...

Curiosamente, na última Quinta-feira foi homenageado D. Francisco de Mascarenhas, decano dos cavaleiros tauromáquicos, que em 2020, comemora 75 anos de Alternativa! E digo curiosamente, porque é da sua autoria a frase que serve para a minha reflexão: Hoje fazem-se muitas coisas aos toiros que dantes não se faziam, mas também noutros tempos se fizeram coisas aos toiros que hoje não se fazem. (Novo Burladero, 2011)

A corrida de Romão Tenório saiu dentro do esperado. Todavia, houve dois toiros menos colaboradores, o terceiro, mais parado (o 1.º do lote de João Telles Jr.); e o quatro, um toiro que esperava e cruzava-se no momento do ferro (o 2.º do lote de Moura Caetano); os restantes investiram na generalidade com ritmo, revelaram uma grande nobreza, transmitiram pouco . saíram à medida do gosto dos toureiros!

Voltando à frase de D. Francisco. Hoje há um toureio!? que pouco tem a ver com o verdadeiro toureio. Para muitos, os toiros deixaram de ter terrenos e distâncias adequadas, nos ferros compridos deixou-se de citar; e nos curtos os cites de praça a praça (com os toiros distraídos) passaram a ser uma constante; desviar a trajectória natural do toiro (com pitóns contrários e quiebros) também passou a ser amiúde (com passagens em falso umas atrás das outras ou reuniões despegadas)e o rol podia continuar! Mas para muitos, as exigências incomodam, os cavaleiros mais velhos estão caducos e os livros antigos cheiram a mofo”…

No entanto, cumprindo as regras do Toureio a Cavalo também se pode criar! Que o diga João Moura Jr., que com as conhecidas Mourinas tem concentrado em si o interesse dos aficionados. No quinto da noite, montado no Hostil, os dois últimos ferros colocaram o Campo Pequeno de pé. O toiro chegou ao fim da lide mais reservado, e Moura Jr. (de costas, como é a abordagem da Mourina) teve que se mostrar muito, teve que provocar, teve que violar fronteiras, avançar ainda mais uns metros que o habitual para depois num curto espaço e em pouco tempo virar-se de frente, e com o cavalo arqueado, receber a investida e cravar de alto a baixo. O mérito foi enorme!!! Do tamanho do mundo!!!

Como nota de rodapé, acrescentar que João Moura Caetano teve uma noite discreta; João Moura Jr., para além das Mourinas”, também recebeu de forma superior o segundo do seu lote; e João Telles Jr. sofreu uma aparatosa queda no último da noite, mas encastou-se e terminou com dois quiebros impactantes. Pelo grupo de Évora pegaram um valente João Pero Oliveira à primeira tentativa, António Alves e Ricardo Sousa, ambos à terceira. Pelo Aposento da Moita (distinguido pela empresa pelos seus 45 anos de existência) concretizaram Leonardo Matias, Martins Lopes e João Ventura, todos à primeira tentativa, com uma convincente prestação do grupo.

A essência da Festa de Toiros estará sempre na emoção, a que é transmitida pelo toiro (não foi o caso) e pelo toureiro!

Foto: Pedro Batalha

terça-feira, 18 de agosto de 2020

CORUCHE: A MESMA DEVOÇÃO, A MESMA AFICIÓN!

Por: Catarina Bexiga

Coruche viveu as Festas em Honra de Nossa Senhora do Castelo de forma diferente, mas com a mesma devoção e a mesma afición. Pois, lá do alto, Nossa Senhora continua a olhar por todosEm tempos de pandemia, nem tudo pode ser vivido como queremos, mas sim como podemos A Monumental Coruchense abriu as portas a 16 e 17 de Agosto, com duas Corridas de quatro toiros, um formato também ele diferente!

Na primeira noite, para o anunciado mano-a-mano entre Manuel Telles Bastos e Francisco Palha, lidaram-se dois toiros de António Silva e outros tantos de Veiga Teixeira. O primeiro de Silva teve mobilidade e o segundo revelou-se mansote. O primeiro de Teixeira foi reservado e o segundo manso encastado.

Do que se viu na arena, Francisto Palha andou muito mais sobrado do que Manuel Bastos. De nota elevada, recordo os ferros compridos de Bastos, montado no Império no primeiro do seu lote; e uma extraordinária gaiola de Palha, montado no Jaquetón no seu segundo. De resto, foi evidente a disposição do cavaleiro do Paul da Vala e, por outro lado, a sensação de querer e não poder do cavaleiro da Torrinha.

Pelo grupo de Coruche pegaram José Tomás à primeira tentativa, um valente João Prates à quarta, Miguel Raposo também à primeira e António Tomás à terceira, numa pega onde o cara esteve superior aos ajudas.

A segunda noite ficou marcada pela apresentação de casaca de António Telles filho. Toureou o segundo da ordem da ganadaria de Ribeiro Telles, sendo evidente a escola do seu pai. Viu-se seguro, com recursos, e especialmente a gosto com o toiro à garupa montado no Embuçado. Dêem-lhe tempopara se cuajar como toureiro!

António Telles teve uma noite de menos a mais. No primeiro de Lopes Branco (um toiro que serviu) o seu toureio foi atípico. No segundo de Vale Sorraia (de meias investidas, trotón e a raspar) sofreu uma aparatosa queda com o Favorito”, mas depois encastou-se, não quis deixar passar a oportunidade de mostrar quem é, e esteve excepcional com o Veneno, com quatro curtos importantes, um hino à verdadeira sorte de caras! Por fim, saiu um sobrero de Cunhal Patrício (em substituição do toiro com o mesmo ferro) que não ajudou, parado nos médios, mas que o cavaleiro superou com placeamento montado no Alcochete.

Pelo grupo de Coruche todas as pegas foram concretizadas ao primeiro intento: Fábio Casinhas, Tiago Gonçalves, e mais duas grande pega de José Tomás e João Prates.

Organização exemplar da empresa Nossa Praça. Em ano de não acontecer. De não fazer. Eles fizeram! Por Coruche e pela afición da sua terra!

Foto: Pedro Batalha

domingo, 16 de agosto de 2020

CALDAS DA RAINHA: O VERBO TOUREAR…

Por: Catarina Bexiga

O verbo TOUREAR pode ser conjugado no passado, presente ou futuro; mas em qualquer dos três tempos possui sempre o mesmo significado. De capacidade. De intuição. De conhecimento. De intencionalidade. De grandeza. De importância. TOUREAR será sempre TOUREAR! Ontem, na tradicional tarde de 15 de Agosto, nas Caldas da Rainha, António Ribeiro Telles mostrou mais uma vez o que é TOUREAR A CAVALO. O seu primeiro toiro de Vale Sorraia procurou as tábuas antes do primeiro comprido e o cavaleiro, de imediato, procurou contrariar-lhe a querença. De curtos, montado no Desejado, o toiro manteve a sua conduta e o cavaleiro o seu propósito. A actuação foi em crescendo, plena de maestria. Com o Desejado a deixar vontade de o rever O quarto curto foi o melhor do conjunto, onde todos os tempos da sorte foram marcados. Preparou superiormente, com atitude e ligação; reuniu com impacto e rematou com torería! Frente ao quarto da tarde de Ribeiro Telles, andou discreto com o Jesuíta de saída; mas voltou a andar primoroso a lidar com o Alcochetede curtos. E esta nem foi a tarde do Alcochete, mas foi a tarde de António Ribeiro Telles. Que se impôs categoricamente, com poderio, e que valeu mais que os cavalos que teve por debaixo. A tourear com a cabeça e o coração. Ora com a garupa ora com a espáduaA forma como preparou as sortes foram um hino ao TOUREIO A CAVALO! Quem entendeu saiu feliz, quem não entendeu teve uma oportunidade única para aprender

Para Manuel Telles Bastos a tarde nunca chegou a levantar voo. O seu primeiro de Vale Sorraia foi complicadote, e Bastos sentiu dificuldades em encontrar soluções para lhe dar a volta. Com o quinto de Ribeiro Telles, de saída, montado no Gabarito da Peramanca, mostrou que se quiser, pode marcar uma posição e, inclusive, meter a música a tocar. O terceiro ferro comprido, à tira, foi extraordinário. E os anteriores só não tiveram o mesmo nível porque faltou dar seriedade ao cite. Depois com o Egípcio e o Ipanema a actuação resultou muito irregular.

Pelos Amadores das Caldas pegaram Duarte Manuel à primeira tentativa, Duarte Palha à terceira, Francisco Esteves à segunda e Lourenço Palha à primeira, na melhor pega da tarde.

Quem também convenceu foi o matador de toiros Joaquim Ribeiro Cuqui. O toiro de Ribeiro Telles teve nobreza e o moitense aproveitou-lhe a sua principal virtude. O que foi evidente logo de capote Depois viu-se concentrado, e embora faltasse ao toiro um pouco mais de raça, Cuqui procurou templar as investidas e contruiu uma faena que foi indo a maisFicou a sensação de que temos mais um nome para a reafirmação do Toureio a Pé em Portugal.

A organização merece uma palavra de reconhecimento, pois graças à sua afición e esforço se pôde cumprir a tradição do 15 de Agosto nas Caldas da Rainha!

Foto: Pedro Batalha

LISBOA: UMA NOITE FEITA DE EXPECTATIVAS…

Por: Catarina Bexiga

Sentia-se expectativa no ar! Essa expectativa que alimenta o Aficionado que nos faz sorrir por um lado e chorar por outro que até nos torna resistentes, mas que nos dá vida!

Desde que foi anunciado, o curro de Murteira Grave criou expectativa! A seriedade dos toiros no campo, assim o justificava rematados de carne, sérios de cara um hino ao Toiro hecho o n.º 99! O lote mais complicado tocou à cavaleira Ana Batista, os dois quase a cumprir seis anos de idade; muito parado o seu primeiro e a descair para os tércios o quatro. Houve dois toiros com chamada à arena do ganadero. O terceiro e o quinto. Pessoalmente, prefiro o quinto, um toiro que investiu com mais convicção, com mais entrega, com mais transmissão!  

Ana Batista comemorou esta noite em Lisboa os seus 20 anos de Alternativa. Pelo que conseguiu ser no toureio, pela trajectória que deixa escrita, merecia ter desfrutado mais  O seu primeiro não lhe deu opções; e o segundo revelou que toureado em curto e a favor da querença era uma mais valia. Quando o fez, o resultado foi logo diferente. O terceiro ferro, montada no Pérola, foi o melhor do conjunto. 

Manuel Telles Bastos teve uma noite animosa no Campo Pequeno. Escrevo animosa, porque o vi com mais peito perante os problemas que teve que contornar. Mas lembro-me do Telles Bastos quando começou, da sua intuição toureira, foi o seu conceito que alimentou a esperança dos aficionados por isso tenho dificuldades em aceitar agora o seu pseudo-conceito. São opções! Com o segundo da noite andou eficaz montado no Egípcio, mas também é justo mencionar a forma poderosa como apontou os compridos no Gabarito da Peramanca; e com o quinto mais vistosos montado no Ipanema”…         

Luís Rouxinol Jr. quis marcar a diferença de saída em ambos do lote. No seu primeiro toiro, o resultado foi mais convincente com o Gabiru. O toiro teve mobilidade, mas do meu ponto de vista investiu de forma menos profunda comparativamente com o quinto. Montado no Douro, a parte final da actuação foi a mais interessante: quando melhor elegeu os terrenos, quando melhor se colocou com o toiro, quando melhor se concentrou no cite Pormenores que fazem a diferença quando se quer tourear bem Com o sexto da noite, andou com entrega e decisão montado no Amoroso, mas a falta de empurre do toiro no momento da reunião retirou brilhantismo à actuação.       

A noite foi exigente para os homens da jaqueta de ramagens. Um desafio à altura dos grandes! Pelos Amadores de Montemor-o-Novo, pegaram Francisco Borges, José Vacas de Carvalho e Bernardo Dentinho. Três pegas à primeira tentativa e uma lição de coesão do grupo. Pelos Amadores de Vila Franca de Xira concretizaram Vasco Pereira à terceira (com uma primeira tentativa rijíssima), David Moreira à segunda e Rui Godinho à primeira.

Que continue a existir expectativa, um dos motores da Festa de Toiros!   

Foto: Pedro Batalha

CAMPO PEQUENO: FICARAM MUITOS SORRISOS POR MOSTRAR E MUITOS ABRAÇOS POR DAR!

Por: Catarina Bexiga

A incerteza tem marcado os últimos tempos. A incerteza de como será o amanhã; de como vamos viver o nosso dia-a-dia com este bicho que nos mete medo; de como vamos voltar a ser quem somos Ontem, no Campo Pequeno, ficaram muitos sorrisos por mostrar e muitos abraços por dar; muitas conversas por ter e muitas emoções por revelar São tempos difíceis, mas aos portugueses nunca faltou espírito de conquista, de superação, de mostrarmos, afinal, quem somos! A pandemia tem-nos colocado à prova; mas a falta de consideração por uma manifestação cultural, que nos corre nas veias, que já levou longe a nossa bandeira, tem-nos feito pior dano   

A primeira Quinta-feira de toiros em Lisboa, depois do desconfinamento, contou com um curro com o ferro de Brito Paes, rematado de carnes, com mais de quatro anos, e que de comportamento veio a mais. Os primeiros toiros ficaram aquém das expectativas, com falta de entrega, sem fijeza alguns, distraídos outros, inclusive complicado o quarto da ordem. Até que saiu o N.º 105 de nome Lezílio, um toiro que foi pronto, teve alegria nas investidas e transmissão. Valeu a chamada à arena do ganadero.

De toureio propriamente dito prefiro reter os pontos positivos, porque seria utopia acreditar que esta nova normalidade iria eliminar velhos vícios”… Luís Rouxinol teve duas actuações distintas. A primeira resultou irregular com o Jamaica”; e a segunda, de ofício e com mérito, montado no Douro, com um toiro que se tapava no momento da reunião. As actuações de Marcos Tenónio começaram de forma superior, mas claramente por opção de conceito desceram de interesse na fase final. Com o seu primeiro toiro, de saída, procurou abordar lentamente, aguardando a investida do adversário; mas depois o público foi a sua maior motivação. Com o seu segundo (o Lezílio) ficou a sensação de que teve o pássaro na mão e deixou-o fugir. Grande começo, montado no Danone, com dois compridos e um curto, que entusiasmaram de verdade, mas depois voltou a enveredar pelo mesmo caminho. Sabe e pode praticar o bom toureio, mas opta por agitar o público de outra forma Duarte Pinto teve uma actuação discreta com o terceiro da noite, embora, no que diz respeito à preparação das sortes, ficassem vários pormenores de quem sabe o que está a fazer. Com o último da noite, viu-se um cavaleiro mais encastado e mais decidido a pisar terrenos de compromisso. Com o Hábito”, cravou com dois curtos impactantes, dos que valem para o aficionado.

Para os homens da jaqueta de ramagens a noite teve vários matizes. Pelos Amadores de Santarém pegaram Salvador Ribeiro de Almeida à segunda tentativa, Joaquim Grave também à segunda e António Queiroz e Melo à terceira. Pelos Amadores de Lisboa concretizaram Duarte Mira à primeira, Vítor Epifânio à segunda e João Varandas à quinta.

Ontem, todos responderam com civismo, respeitando as orientações (na arena e na bancada) que nos foram impostas, para que voltasse a haver toiros na capital. Esse foi o maior triunfo da noite!

Foto: Touradas / Luis Monge


segunda-feira, 6 de julho de 2020

ERA MADRUGADA DE COLETE ENCARNADO...

Por: Catarina Bexiga

Era madrugada de Colete Encarnado. Vila Franca estava despida de gente. Estava desbotada. Estava atípica. Estava nostálgica. As horas tardavam em passar e o sono em aparecer… Bastava esse ambiente, para nos deixar um vazio no coração…

Como vi escrito algures, não era dia, nem hora para se morrer… mas Mário Coelho – Toureiro poético, sonhador, apaixonado – deixou-nos, exactamente, na madrugada de Colete Encarnado. Quis o destino. Quis a “sorte”!

Mário Coelho nasceu em Vila Fraca a 25 de Março de 1936. Como é sabido, a primeira parte da sua trajectória nas arenas aconteceu vestido de “prata”. Prestou provas para praticante, 3 de Outubro de 1955, na Palha Blanco; e tomou a alternativa, a 13 de Setembro de 1958, na praça de toiros da Nazaré. Durante nove anos vestiu de “prata”, conquistando os mais importantes troféus em disputa. Ao lado de Andrés Vazquez, o seu nome foi cobiçado e enaltecido.

Atestam as palavras do Maestro de Zamora: “ El gran Mário, con quien compartí muchos de los momentos más grandes de mí vida (…) Com Mário me unen muchas cosas, personales y profesionales, que tanto me han enriquecido. Por eso nuestros nombres van unidos bajo el orgullo que supusieron para la afición en una gloriosa época del toreo, como fueron los años sessenta (…) Mário ha sido el banderillero más grande de todos los tempos. El más colossal y artista que ponía de pie a todos los tendidos com um par en sus manos. Qué memorables tardes ofreció en las mejores ferias! Qué recuerdos de los tércios compartidos cuando las plazas se venían abajo y arrancaban los sones de la banda de música! Se me humedecen los ojos de la emoción al recordar las cuatro tardes que salió comigo en hombros. Lo que no hizo jamás ningún torero de plata hasta entonces.”

Perseguido o sonho, Mário Coelho trocou a “prata” pelo “ouro”. A sua trajectoria como novilheiro foi curta, tomando a alternativa de Matador de Toiros, a 23 de Julho de 1967, na praça de toiros de Badajoz, tendo como padrinho Julio Aparicio e testemunha “El Pireo”. Estoqueou a “Granjero” da ganadaria de Sanchez Rico.

Entre outras tardes de glória, há uma de que todos falam. A 12 de Setembro de 1984, Mário Coelho estoqueou “Corisco”, da ganadaria de Ernestro de Castro, na “Daniel do Nascimento”, Moita.

Despediu-se das arenas a 20 de Setembro de 1990 na praça de toiros do Campo Pequeno, mas o seu nome continuou ligado à Festa de Toiros, quer como conselheiro de ganadarias portuguesas, quer no lançamento de jovens toureiros…

Entre outras distinções, em 1990 recebeu, do Secretário de Estado da Cultura, a Medalha de Mérito Cultural; em 2004 recebeu, da Câmara Municipal de Vila Franca, a Medalha de Valor Cultural; e em 2005 foi agraciado, pelo Presidente da República, com a Condecoração de Comendador da Ordem do Mérito.

Mário Coelho viveu intensamente o toureio. Dentro e fora das arenas. Quem o vi-a na rua, no seu dia a dia, não tinha dúvidas em afirmar: “Ali vai um Toureiro!” Viveu o que hoje não se vive. Defendeu uma ética que hoje poucos defendem. E viu, em vida, o reconhecimento merecido. Descanse em paz, Maestro!

domingo, 5 de julho de 2020

HOJE É DOMINGO DE COLETE ENCARNADO…

Por: Catarina Bexiga

Hoje é DOMINGO DE COLETE ENCARNADO. Não há movimento. Não cheira a sardinha assada. Não se ouvem os foguetes a anunciar o toiro nas ruas. Há até um certo vazio. Mas há muitas montras e varandas enfeitadas. Há uma coroa de flores no Monumento ao Campino e há – O MAIS IMPORTANTE – muitas memórias, muitas histórias vividas e uma terra orgulhosa da sua identidade cultural!

E uma terra orgulhosa da sua identidade cultural é uma terra com futuro. Que sabe o que tem. Que sabe o que vale. Que sabe o que quer. É uma terra com GENTE e não com gente. Porque escrito com maiúsculas significa todo o peso da herança deixada pelos seus antepassados e toda a responsabilidade na sua salvaguarda e preservação.

Hoje é Domingo de Colete Encarnado. Para trás ficou uma noite atípica. Sem que déssemos conta daquele cenário descrito por João Nobre e cantado por Amália Rodrigues (no ano das comemorações do seu nascimento merece ser lembrada como grande aficionada): “Vão um dia a Vila Franca, é meu conselho, vejam da ponte um por-de-sol tão vermelho ao longe no horizonte…”

Hoje é Domingo de Colete Encarnado. Não se vêm Campinos nas ruas, esses homens que nos enchem de orgulho enquanto ribatejanos e portugueses. Mas eles estão no nosso coração. Como diz o fado “Gente feliz, Gente sã. Não sabem como os invejam ao vê-los pela manhã. Quem vem assim confiado junto do gado é que está crente, que esses bravos animais são mais leais que muita gente…”

Hoje é Domingo de Colete Encarnado. É um dia que também pode ser vivido de recordações… Cada um terá as suas (os Vilafranquenses sabem do que falo…). Porque em cada recanto de Vila Franca há “passado, presente e também futuro”. Em cada Tertúlia há memórias e histórias que se repetem todos os anos e que são contadas a quem nos visita. Porque Vila Franca jamais esconderá a sua afición!

Hoje é Domingo de Colete Encarnado. O sol brilha e o calor aperta. A Palha Blanco estaria mais bonita que nunca. Como só ela sabe estar. Com aquele colorido. Com aquele ambiente. Com aqueles aplausos que sabem a eternidade… O cartel merecia casa cheia! Mas este ano é diferente. Porventura, o destino colocou-nos à prova e transformou-nos em mais fortes, mais unidos, ainda mais orgulhosos!

Domingo de Colete Encarnado de 2021 espera por nós!

COLETE ENCARNADO: Candidato 7 Maravilhas da Cultura Popular. Vote 760 207 828

domingo, 5 de abril de 2020

A VIDA COMO METÁFORA DO TOUREIO*

Por: Catarina Bexiga

Entre a vida e o toureio existem inúmeras semelhanças. Se pensarmos bem, o que requer a vida, requer o toureio.

Na vida como no toureio, é preciso ter as ideias claras. Saber de onde vimos e para onde vamos. Ter consciência de que pela frente temos um longo trajecto a percorrer. Que vamos trilhar bons e maus caminhos. Mas que somos nós próprios que temos que eleger como os queremos percorrer.

Na vida como no toureio é preciso ter valor. Valor para enfrentar o desconhecido, porque o dia de amanhã é um segredo por desvendar e o toiro também. Valor para abafar os medos. Medos que são próprios da vida e do toureio. Valor para superar as dificuldades. Dificuldades que aparecem quando menos se espera. Nunca sobra valor!

A vida também dá cornadas. E quando essas surgem, não é fácil voltar a pisar os mesmos terrenos. Pode levar dias, meses, anos… mas, também há quem nunca mais consiga voltar a vestir-se de luzes. Em cada um de nós tem que haver força interior, uma força, que às vezes nem achamos que temos….

Na vida, a Fé faz-nos caminhar acompanhados. Como no Toureio. Acreditar em Deus é uma questão muito pessoal. Cada um de nós sabe como o sente. Ter Fé é estar convicto de que só Deus é capaz de nos completar. É buscar em Deus a parte que nos falta. Ter Fé é segurarmos-nos a Deus, como o filho segura a mão do pai.

Todos ambicionamos superar estes dias difíceis. Para que em breve, possamos estar juntos, possamo-nos abraçar, possamos ir aos toiros… voltar a viver intensamente a nossa paixão!

Afinal, viver é tourear e tourear é viver!

Fique em casa!

*Adaptação ao artigo publicado na Revista Novo Burladero, n.º 294, Maio 2013.

sábado, 4 de abril de 2020

UMA ARTE PROFUNDAMENTE PORTUGUESA…

Por: Catarina Bexiga

O Toureio a Cavalo é uma arte profundamente portuguesa. Por isso, apelamos ao nosso/vosso patriotismo. Para que o público não se aborreça é preciso que entenda os “pormenores” de que é feito o Toureio a Cavalo, pois só assim conseguirá verificar que não existem duas lides iguais, porque não existem dois toiros iguais. E ao entender o que observa, conseguirá distinguir o mérito de cada actuação… Durante os próximos dias vamos publicar breves notas sobre o Toureio a Cavalo, com descrições, imagens e vídeos. Junte-se a nós, na exaltação do Toureio a Cavalo. 

BREVES NOTAS SOBRE O TOUREIO A CAVALO (I)
O que é lidar?
Cada toiro requer a sua lide, porque cada toiro tem a sua personalidade, isto é:
- Codícia
- Prontidão
- Velocidade de investida
- Ritmo da investida
- Humilhação
- Terrenos
- Querenças
- Distâncias
Etc.
Cada toiro tem características especiais, que é preciso ter em conta para lhe dar as “respostas” adequadas.
Lidar o toiro é movê-lo na arena, procurando-lhe o melhor “sítio” para operar, convencê-lo a arrancar se for tardo, dominar-lhe a investida se for impetuoso, corrigi-lo se tiver defeitos, ampliar-lhe as virtudes, etc…
Em suma, a preparação da sorte (lidar) resulta do estudo do toiro.

BREVES NOTAS SOBRE O TOUREIO A CAVALO (II)
As sortes do toureio…
Cada sorte tem o seu valor – como é evidente – conforme o toiro, o terreno, a posição do cavalo e do toiro no momento da reunião, a velocidade com que é executada, consoante se espere a investida ou se inicie o ataque, etc.
A sorte para sair perfeita e com mérito, para não ser por mera casualidade, tem que ser preparada.
Existe uma grande diversidade de sorte, umas deixaram de fazer sentido com o aparecimento do toiro puro (imposto por Mestre João Branco Núncio no início do século XX), outras entraram em desuso e outras ainda são de recente criação…
É importante que da sorte façam parte todos os seus tempos, nunca se devendo esquecer, por exemplo, o Cite e o Remate.
De saída (as mais frequentes):
- À Tira
- De Caras
- Porta Gaiola
- Gaiola
De curtos (as mais frequentes):
- De caras
- Pitón Contrário
- Quiebro
- Mourina (recém criada por João Moura Jr.)
Fase final da actuação:
- Par de Bandarilhas
- Violino
- Palmo
→ As sortes do toureio também conhecem denominação de acordo com os terrenos em que são executadas:
- Nos médios
- De dentro para fora
- De fora para dentro
- No corredor das tábuas
- A sesgo
As sortes do toureio também conhecem denominação de acordo com a investida do adversário:
- A receber
- A atacar

BREVES NOTAS SOBRE O TOUREIO A CAVALO (III)
A reunião…
A reunião é o momento culminar do toureio, o momento mais difícil, o mais perigoso, o mais emocionante.
A reunião (centro da sorte) é o ponto de encontro em que, no desenrolar da sorte, o toureiro se encontra com o toiro. É necessário que os dois concorrentes avancem ao encontro um do outro, ou que esperem um pelo outro, e que as suas trajectórias sejam convergentes no momento da reunião.
Deve a reunião ser feita à espádua ou ao estribo.

BREVES NOTAS SOBRE O TOUREIO A CAVALO (IV)
A verdadeira sorte de caras…
A sorte de caras é a única que tem todos os predicados do verdadeiro toureio, pois é com ela que se dominam os toiros. 
Na verdade, a sorte de caras é rígida (e exigente) no seu traçado. Deve-se imaginar um corredor formado por duas linhas paralelas, que saem dos pitóns do toiro até ao peito do cavalo. E o cavaleiro só se pode movimentar nesse corredor. Nem ir para a esquerda, nem para a direita. O cavalo deve manter a rectidão até chegar o mais perto do toiro que lhe seja possível. Por fim, o quarteio será tanto mais valeroso quanto imperceptível.

BREVES NOTAS SOBRE O TOUREIO A CAVALO (V)
O adorno das sortes…
Os ares de alta escola são a estilização dos andamentos naturais do cavalo e encontram no toureio um veículo de melhoria/variedade da própria lide e também de aproximação ao grande público, pela sua beleza ou pela sua espectacularidade.
Os adornos são um complemento importante e devem ser feitos antes ou depois da execução da sorte propriamente dita. São frequentes: Passage, Piaffé, Pirueta, Passe Espanhol, Jambete, Terra-a-terra, Levada, etc.

BREVES NOTAS SOBRE O TOUREIO A CAVALO (VI)
O cavalo de toiros…
Um cavalo de toureio tem enorme valor. Foram precisos muitos maus, para se encontrar o bom, foi necessário muito trabalho para o ensinar e muitos anos para conseguir que chegue a ser um bom cavalo de toiros. Mas, sobretudo, tem enorme valor, porque dele depende a segurança, a glória e a economia do cavaleiro.
A equitação permite mais facilmente tirar partido de cada cavalo; saber pô-los, saber aproveitá-los, saber corrigi-los. Para além das capacidades naturais, o mais importante no cavalo de toureio é ter boa cabeça. Isto é, capacidade para perceber o que se lhe quer ensinar e capacidade para “dar a cara” sempre que sai à arena.
Em Portugal existem um número considerável de Coudelarias que ainda hoje seleccionam os seus produtos em função das aptidões para o Toureio a Cavalo.

segunda-feira, 16 de março de 2020

MAIS CORNADAS DÁ A VIDA QUE UM TOIRO TRESMALHADO…


Por: Catarina Bexiga

O mundo está em estado de alerta. É certo que tenho mais tempo para escrever, mas menos motivação. O Coronavírus deixa-nos a todos sem resposta para muitas perguntas. No dia de “ontem” estávamos tranquilos e seguros; hoje aconselham-nos ao isolamento social; existem filas longas nos supermercados e muitas pessoas às portas das farmácias, restaurantes quase todos fechados… não há futebol, não há cinema, não há teatro, não há concertos, não há toiros… não há nada!

Em Espanha já se cancelaram as Feiras de Valência (8 espectáculos), Castellón (7), Arnedo (2), Arles (6) e Sevilha (14); os primeiros espetáculos de Madrid (2), como também a corrida de Morón de la Frontera e o festival de Murcia. Ou seja, 41 espetáculos que não se realizam, o mesmo é dizer 246 toiros que ficam no campo.

Em Portugal estão sem efeito as datas anunciadas para Beja, Moita, Santarém, Chamusca, Vila Franca de Xira, Redondo, Almeirim, Alpalhão e Amareleja. 9 espectáculos anulados e 54 toiros no campo.

Como disse o ganadero Santiago Domeccq “Desgraciadamente el campo no sobrevive a una cuarentena. Es verdade que allí estas casi aislado, pero los animales necesitan una serie de cuidados diários y somos nosotros, los que los amamos, responsables…”  
O Coronavíris irá trazer consequências desastrosas para todos os sectores, inclusive o sector taurino. Sabemos da quantidade de pessoas que vivem da Festa de Toiros, um “universo” que vai para lá dos toureiros, ganaderos, empresários…

Inclusive a Revista Novo Burladero também já suspendeu a sua edição mensal até que a temporada recomece. Mas preparados para voltar logo que a pandemia seja dada como superada.  

Neste momento, todos temos que ser conscientes. Da nossa atitude hoje, depende o nosso dia de amanhã. Fique em casa! A falar de toiros. A ler de toiros. Juntos (com Fé em Deus e Esperança) vamos superar esta “cornada”. Como os toureiros valentes!

quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

MAGISTRAL LIÇÃO DE TOUREIO A CAVALO!


Por: Catarina Bexiga

Tão importante quanto colocar em prática na arena o Toureio a Cavalo é saber explica-lo, transmiti-lo e valorizá-lo! Essa é uma “herança” importantíssima que, com o passar dos anos, se tem vindo a desaproveitar… Perdeu-se o hábito de ouvir, de falar e de ler sobre o que é o Toureio a Cavalo. E isso nota-se cada vez mais por todo o lado! Como escreveu Fernando Sommer d’Andrade “Para que o público não se aborreça é necessário que entenda os «pequenos nadas» de que é feita a lide e, só assim, lhe será dado a verificar que não há duas actuações iguais por as condições dos toiros diferirem de uns para outros, por a disposição do cavalo e, até o estado de espírito do cavaleiro, variarem de dia para dia.”

O colóquio de ontem no Montijo sobre o Toureio a Cavalo, com a presença de Emídio Pinto e António Ribeiro Telles – magistrais nas suas explicações – acompanhados pelos testemunhos de Luís Rouxinol Jr., foi uma abordagem conhecedora, concreta e clara sobre o tema. O “ABC do Toureio a cavalo”, aquele que a maioria do público (entre entusiastas e aficionados) deve saber…
Por considerar de extrema importância, partilho (embora resumidamente) os 10 pontos analisados na noite de ontem:

1 – INICO DE CADA CARREIRA: Cada um dos intervenientes apresentou a sua história de vida e falou de quem os marcou nas suas origens. Emídio Pinto referiu-se a Frederico Cunhas, e aos irmãos Manuel e Alfredo Conde, bem como D. José d’Atayde; António Ribeiro Telles ao seu pai Mestre David Ribeiro Telles; e Luís Rouxinol Jr. ao seu pai Luís Rouxinol.

2 – A IMPORTÂNCIA DA EQUITAÇÃO: Todos defenderam a ideia de que ter equitação permite mais facilmente tirar partido de cada cavalo; saber pô-los, saber aproveitá-los, saber corrigi-los, etc. Mas que uma coisa é o bom cavaleiro e outra é o cavaleiro bonito.
3 – BREGAR/LIDAR/TOUREAR: O significado é o mesmo e de máxima importância. Entender o toiro (terrenos, distancias, etc.) para mais brilhantemente atingir o culminar do toureio, cravar o ferro ao estribo!

4 – OS MARCOS NA EVOLUÇÃO DO TOUREIO A CAVALO: Para além de outros nomes que aportaram história à própria história do Toureio a Cavalo foram referenciados como os grandes “revolucionários”: João Núncio, José Mestre Batista e João Moura.

5 – AS GRANDES DUPLAS DO TOUREIO A CAVALO: Foram sem dúvida épocas importantes. As grandes duplas formadas por João Núncio/Simão da Veiga, José Mestre Batista/Luís Miguel da Veiga e António Telles/João Salgueiro enriqueceram de sobremaneira a nossa identidade.  

6 – O TOIRO BOM E O TOIRO MAU: Todos defenderam a ideia de que o toiro bom é o que vai pelo seu caminho. Até pode ter raça. Até pode empurrar. O toiro mau é o que se adianta, é o que se atravessa, é o que desconfia os cavalos (e até os cavaleiros).

7 – O CAVALO DE TOUREIO: Para além das capacidades naturais (força, habilidade, etc.), o mais importante no cavalo de toureio é ter boa cabeça. Capacidade para perceber o que se lhe quer ensinar e capacidade para todos os dias “dar a cara”. A ilusão com os cavalos novos marca cada Inverno. Mas todos defenderam que em casa, com as vacas, todos os cavalos parecem funcionar; o problema é quando o toiro aparece, e quando se toureia hoje, amanhã e depois de amanhã. 

8 – AS COUDELARIAS NO TOUREIO: Nos últimos tempos os Lusitanos melhoraram muito; mas o mercado dos cavalo que tinham uma percentagem de cruzamente (exemplo de Coudelarias como Gama, Atalaya ou Rio Frio), o que lhes permitia ter outras capacidades físicas, é o mais apetecido pelos toureiros. No entanto, esse mercado tem vindo a desaparecer e hoje é cada vez mais difícil encontrar o cavalo ideal.

9 – SORTES DO TOUREIO: Todas as sortes têm o seu valor. Uma “gaiola” tem muito valor mesmo, e uma “tira” também! Foi defendida a verdade do toureio como o corredor formado por duas linhas paralelas, que saem dos pitons do toiro, até ao peito do cavalo. E foi clarificado que, antes da reunião, se existir um desvio à direita, desequilibra-se o toiro; e se existir um desvio à esquerda, o cavalo atravessa-se… O termo “carregar a sorte ao pitón contrário” – muito na moda nos templos actuais – foi questionado até que ponto não é “descarregar a sorte”, visto que manda o toiro para fora da sua trajetória natural…

10 – QUAL O FUTURO? Para além da preocupação com os movimentos animalistas, que cada fez asfixiam mais o espectáculo taurino, falou-se no diminuto número de cavaleiros amadores que fazem parte do actual escalafón; e no regresso do toiro que transmita emoção, para que seja dado valor à obra do toureiro.

Em suma, uma grande noite de Toureio a Cavalo fora das arenas!

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