sexta-feira, 28 de agosto de 2020

LISBOA: TESTEMUNHO E REFLEXÃO!

Por: Catarina Bexiga

Hoje vou abordar a última Quinta-feira no Campo Pequeno de forma diferente O Toureio a Cavalo está numa fase de importante (mas também inquieta) transição. Ora vejamos, cavaleiros com mais de vinte e cinco anos de Alternativa (ex. de Moura, Telles, Salvador, Rouxinol, etc.) já têm as suas carreiras confirmadas e a os seus méritos assegurados. Daí que, sejam os nomes que fazem parte das gerações seguintes, os actores dos próximos episódios da História do Toureio a Cavalo...

Curiosamente, na última Quinta-feira foi homenageado D. Francisco de Mascarenhas, decano dos cavaleiros tauromáquicos, que em 2020, comemora 75 anos de Alternativa! E digo curiosamente, porque é da sua autoria a frase que serve para a minha reflexão: Hoje fazem-se muitas coisas aos toiros que dantes não se faziam, mas também noutros tempos se fizeram coisas aos toiros que hoje não se fazem. (Novo Burladero, 2011)

A corrida de Romão Tenório saiu dentro do esperado. Todavia, houve dois toiros menos colaboradores, o terceiro, mais parado (o 1.º do lote de João Telles Jr.); e o quatro, um toiro que esperava e cruzava-se no momento do ferro (o 2.º do lote de Moura Caetano); os restantes investiram na generalidade com ritmo, revelaram uma grande nobreza, transmitiram pouco . saíram à medida do gosto dos toureiros!

Voltando à frase de D. Francisco. Hoje há um toureio!? que pouco tem a ver com o verdadeiro toureio. Para muitos, os toiros deixaram de ter terrenos e distâncias adequadas, nos ferros compridos deixou-se de citar; e nos curtos os cites de praça a praça (com os toiros distraídos) passaram a ser uma constante; desviar a trajectória natural do toiro (com pitóns contrários e quiebros) também passou a ser amiúde (com passagens em falso umas atrás das outras ou reuniões despegadas)e o rol podia continuar! Mas para muitos, as exigências incomodam, os cavaleiros mais velhos estão caducos e os livros antigos cheiram a mofo”…

No entanto, cumprindo as regras do Toureio a Cavalo também se pode criar! Que o diga João Moura Jr., que com as conhecidas Mourinas tem concentrado em si o interesse dos aficionados. No quinto da noite, montado no Hostil, os dois últimos ferros colocaram o Campo Pequeno de pé. O toiro chegou ao fim da lide mais reservado, e Moura Jr. (de costas, como é a abordagem da Mourina) teve que se mostrar muito, teve que provocar, teve que violar fronteiras, avançar ainda mais uns metros que o habitual para depois num curto espaço e em pouco tempo virar-se de frente, e com o cavalo arqueado, receber a investida e cravar de alto a baixo. O mérito foi enorme!!! Do tamanho do mundo!!!

Como nota de rodapé, acrescentar que João Moura Caetano teve uma noite discreta; João Moura Jr., para além das Mourinas”, também recebeu de forma superior o segundo do seu lote; e João Telles Jr. sofreu uma aparatosa queda no último da noite, mas encastou-se e terminou com dois quiebros impactantes. Pelo grupo de Évora pegaram um valente João Pero Oliveira à primeira tentativa, António Alves e Ricardo Sousa, ambos à terceira. Pelo Aposento da Moita (distinguido pela empresa pelos seus 45 anos de existência) concretizaram Leonardo Matias, Martins Lopes e João Ventura, todos à primeira tentativa, com uma convincente prestação do grupo.

A essência da Festa de Toiros estará sempre na emoção, a que é transmitida pelo toiro (não foi o caso) e pelo toureiro!

Foto: Pedro Batalha

terça-feira, 18 de agosto de 2020

CORUCHE: A MESMA DEVOÇÃO, A MESMA AFICIÓN!

Por: Catarina Bexiga

Coruche viveu as Festas em Honra de Nossa Senhora do Castelo de forma diferente, mas com a mesma devoção e a mesma afición. Pois, lá do alto, Nossa Senhora continua a olhar por todosEm tempos de pandemia, nem tudo pode ser vivido como queremos, mas sim como podemos A Monumental Coruchense abriu as portas a 16 e 17 de Agosto, com duas Corridas de quatro toiros, um formato também ele diferente!

Na primeira noite, para o anunciado mano-a-mano entre Manuel Telles Bastos e Francisco Palha, lidaram-se dois toiros de António Silva e outros tantos de Veiga Teixeira. O primeiro de Silva teve mobilidade e o segundo revelou-se mansote. O primeiro de Teixeira foi reservado e o segundo manso encastado.

Do que se viu na arena, Francisto Palha andou muito mais sobrado do que Manuel Bastos. De nota elevada, recordo os ferros compridos de Bastos, montado no Império no primeiro do seu lote; e uma extraordinária gaiola de Palha, montado no Jaquetón no seu segundo. De resto, foi evidente a disposição do cavaleiro do Paul da Vala e, por outro lado, a sensação de querer e não poder do cavaleiro da Torrinha.

Pelo grupo de Coruche pegaram José Tomás à primeira tentativa, um valente João Prates à quarta, Miguel Raposo também à primeira e António Tomás à terceira, numa pega onde o cara esteve superior aos ajudas.

A segunda noite ficou marcada pela apresentação de casaca de António Telles filho. Toureou o segundo da ordem da ganadaria de Ribeiro Telles, sendo evidente a escola do seu pai. Viu-se seguro, com recursos, e especialmente a gosto com o toiro à garupa montado no Embuçado. Dêem-lhe tempopara se cuajar como toureiro!

António Telles teve uma noite de menos a mais. No primeiro de Lopes Branco (um toiro que serviu) o seu toureio foi atípico. No segundo de Vale Sorraia (de meias investidas, trotón e a raspar) sofreu uma aparatosa queda com o Favorito”, mas depois encastou-se, não quis deixar passar a oportunidade de mostrar quem é, e esteve excepcional com o Veneno, com quatro curtos importantes, um hino à verdadeira sorte de caras! Por fim, saiu um sobrero de Cunhal Patrício (em substituição do toiro com o mesmo ferro) que não ajudou, parado nos médios, mas que o cavaleiro superou com placeamento montado no Alcochete.

Pelo grupo de Coruche todas as pegas foram concretizadas ao primeiro intento: Fábio Casinhas, Tiago Gonçalves, e mais duas grande pega de José Tomás e João Prates.

Organização exemplar da empresa Nossa Praça. Em ano de não acontecer. De não fazer. Eles fizeram! Por Coruche e pela afición da sua terra!

Foto: Pedro Batalha

domingo, 16 de agosto de 2020

CALDAS DA RAINHA: O VERBO TOUREAR…

Por: Catarina Bexiga

O verbo TOUREAR pode ser conjugado no passado, presente ou futuro; mas em qualquer dos três tempos possui sempre o mesmo significado. De capacidade. De intuição. De conhecimento. De intencionalidade. De grandeza. De importância. TOUREAR será sempre TOUREAR! Ontem, na tradicional tarde de 15 de Agosto, nas Caldas da Rainha, António Ribeiro Telles mostrou mais uma vez o que é TOUREAR A CAVALO. O seu primeiro toiro de Vale Sorraia procurou as tábuas antes do primeiro comprido e o cavaleiro, de imediato, procurou contrariar-lhe a querença. De curtos, montado no Desejado, o toiro manteve a sua conduta e o cavaleiro o seu propósito. A actuação foi em crescendo, plena de maestria. Com o Desejado a deixar vontade de o rever O quarto curto foi o melhor do conjunto, onde todos os tempos da sorte foram marcados. Preparou superiormente, com atitude e ligação; reuniu com impacto e rematou com torería! Frente ao quarto da tarde de Ribeiro Telles, andou discreto com o Jesuíta de saída; mas voltou a andar primoroso a lidar com o Alcochetede curtos. E esta nem foi a tarde do Alcochete, mas foi a tarde de António Ribeiro Telles. Que se impôs categoricamente, com poderio, e que valeu mais que os cavalos que teve por debaixo. A tourear com a cabeça e o coração. Ora com a garupa ora com a espáduaA forma como preparou as sortes foram um hino ao TOUREIO A CAVALO! Quem entendeu saiu feliz, quem não entendeu teve uma oportunidade única para aprender

Para Manuel Telles Bastos a tarde nunca chegou a levantar voo. O seu primeiro de Vale Sorraia foi complicadote, e Bastos sentiu dificuldades em encontrar soluções para lhe dar a volta. Com o quinto de Ribeiro Telles, de saída, montado no Gabarito da Peramanca, mostrou que se quiser, pode marcar uma posição e, inclusive, meter a música a tocar. O terceiro ferro comprido, à tira, foi extraordinário. E os anteriores só não tiveram o mesmo nível porque faltou dar seriedade ao cite. Depois com o Egípcio e o Ipanema a actuação resultou muito irregular.

Pelos Amadores das Caldas pegaram Duarte Manuel à primeira tentativa, Duarte Palha à terceira, Francisco Esteves à segunda e Lourenço Palha à primeira, na melhor pega da tarde.

Quem também convenceu foi o matador de toiros Joaquim Ribeiro Cuqui. O toiro de Ribeiro Telles teve nobreza e o moitense aproveitou-lhe a sua principal virtude. O que foi evidente logo de capote Depois viu-se concentrado, e embora faltasse ao toiro um pouco mais de raça, Cuqui procurou templar as investidas e contruiu uma faena que foi indo a maisFicou a sensação de que temos mais um nome para a reafirmação do Toureio a Pé em Portugal.

A organização merece uma palavra de reconhecimento, pois graças à sua afición e esforço se pôde cumprir a tradição do 15 de Agosto nas Caldas da Rainha!

Foto: Pedro Batalha

LISBOA: UMA NOITE FEITA DE EXPECTATIVAS…

Por: Catarina Bexiga

Sentia-se expectativa no ar! Essa expectativa que alimenta o Aficionado que nos faz sorrir por um lado e chorar por outro que até nos torna resistentes, mas que nos dá vida!

Desde que foi anunciado, o curro de Murteira Grave criou expectativa! A seriedade dos toiros no campo, assim o justificava rematados de carne, sérios de cara um hino ao Toiro hecho o n.º 99! O lote mais complicado tocou à cavaleira Ana Batista, os dois quase a cumprir seis anos de idade; muito parado o seu primeiro e a descair para os tércios o quatro. Houve dois toiros com chamada à arena do ganadero. O terceiro e o quinto. Pessoalmente, prefiro o quinto, um toiro que investiu com mais convicção, com mais entrega, com mais transmissão!  

Ana Batista comemorou esta noite em Lisboa os seus 20 anos de Alternativa. Pelo que conseguiu ser no toureio, pela trajectória que deixa escrita, merecia ter desfrutado mais  O seu primeiro não lhe deu opções; e o segundo revelou que toureado em curto e a favor da querença era uma mais valia. Quando o fez, o resultado foi logo diferente. O terceiro ferro, montada no Pérola, foi o melhor do conjunto. 

Manuel Telles Bastos teve uma noite animosa no Campo Pequeno. Escrevo animosa, porque o vi com mais peito perante os problemas que teve que contornar. Mas lembro-me do Telles Bastos quando começou, da sua intuição toureira, foi o seu conceito que alimentou a esperança dos aficionados por isso tenho dificuldades em aceitar agora o seu pseudo-conceito. São opções! Com o segundo da noite andou eficaz montado no Egípcio, mas também é justo mencionar a forma poderosa como apontou os compridos no Gabarito da Peramanca; e com o quinto mais vistosos montado no Ipanema”…         

Luís Rouxinol Jr. quis marcar a diferença de saída em ambos do lote. No seu primeiro toiro, o resultado foi mais convincente com o Gabiru. O toiro teve mobilidade, mas do meu ponto de vista investiu de forma menos profunda comparativamente com o quinto. Montado no Douro, a parte final da actuação foi a mais interessante: quando melhor elegeu os terrenos, quando melhor se colocou com o toiro, quando melhor se concentrou no cite Pormenores que fazem a diferença quando se quer tourear bem Com o sexto da noite, andou com entrega e decisão montado no Amoroso, mas a falta de empurre do toiro no momento da reunião retirou brilhantismo à actuação.       

A noite foi exigente para os homens da jaqueta de ramagens. Um desafio à altura dos grandes! Pelos Amadores de Montemor-o-Novo, pegaram Francisco Borges, José Vacas de Carvalho e Bernardo Dentinho. Três pegas à primeira tentativa e uma lição de coesão do grupo. Pelos Amadores de Vila Franca de Xira concretizaram Vasco Pereira à terceira (com uma primeira tentativa rijíssima), David Moreira à segunda e Rui Godinho à primeira.

Que continue a existir expectativa, um dos motores da Festa de Toiros!   

Foto: Pedro Batalha

CAMPO PEQUENO: FICARAM MUITOS SORRISOS POR MOSTRAR E MUITOS ABRAÇOS POR DAR!

Por: Catarina Bexiga

A incerteza tem marcado os últimos tempos. A incerteza de como será o amanhã; de como vamos viver o nosso dia-a-dia com este bicho que nos mete medo; de como vamos voltar a ser quem somos Ontem, no Campo Pequeno, ficaram muitos sorrisos por mostrar e muitos abraços por dar; muitas conversas por ter e muitas emoções por revelar São tempos difíceis, mas aos portugueses nunca faltou espírito de conquista, de superação, de mostrarmos, afinal, quem somos! A pandemia tem-nos colocado à prova; mas a falta de consideração por uma manifestação cultural, que nos corre nas veias, que já levou longe a nossa bandeira, tem-nos feito pior dano   

A primeira Quinta-feira de toiros em Lisboa, depois do desconfinamento, contou com um curro com o ferro de Brito Paes, rematado de carnes, com mais de quatro anos, e que de comportamento veio a mais. Os primeiros toiros ficaram aquém das expectativas, com falta de entrega, sem fijeza alguns, distraídos outros, inclusive complicado o quarto da ordem. Até que saiu o N.º 105 de nome Lezílio, um toiro que foi pronto, teve alegria nas investidas e transmissão. Valeu a chamada à arena do ganadero.

De toureio propriamente dito prefiro reter os pontos positivos, porque seria utopia acreditar que esta nova normalidade iria eliminar velhos vícios”… Luís Rouxinol teve duas actuações distintas. A primeira resultou irregular com o Jamaica”; e a segunda, de ofício e com mérito, montado no Douro, com um toiro que se tapava no momento da reunião. As actuações de Marcos Tenónio começaram de forma superior, mas claramente por opção de conceito desceram de interesse na fase final. Com o seu primeiro toiro, de saída, procurou abordar lentamente, aguardando a investida do adversário; mas depois o público foi a sua maior motivação. Com o seu segundo (o Lezílio) ficou a sensação de que teve o pássaro na mão e deixou-o fugir. Grande começo, montado no Danone, com dois compridos e um curto, que entusiasmaram de verdade, mas depois voltou a enveredar pelo mesmo caminho. Sabe e pode praticar o bom toureio, mas opta por agitar o público de outra forma Duarte Pinto teve uma actuação discreta com o terceiro da noite, embora, no que diz respeito à preparação das sortes, ficassem vários pormenores de quem sabe o que está a fazer. Com o último da noite, viu-se um cavaleiro mais encastado e mais decidido a pisar terrenos de compromisso. Com o Hábito”, cravou com dois curtos impactantes, dos que valem para o aficionado.

Para os homens da jaqueta de ramagens a noite teve vários matizes. Pelos Amadores de Santarém pegaram Salvador Ribeiro de Almeida à segunda tentativa, Joaquim Grave também à segunda e António Queiroz e Melo à terceira. Pelos Amadores de Lisboa concretizaram Duarte Mira à primeira, Vítor Epifânio à segunda e João Varandas à quinta.

Ontem, todos responderam com civismo, respeitando as orientações (na arena e na bancada) que nos foram impostas, para que voltasse a haver toiros na capital. Esse foi o maior triunfo da noite!

Foto: Touradas / Luis Monge


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